Cheguei ao hotel em Florença. Constrangido, o dono me avisou que houvera problema com a linha telefônica. Se eu precisasse acessar a internet ele me arranjaria outro hotel.
No mesmo instante, chegou a moça para fazer o seu check-in. Avisada de que não teria linha para a internet, perguntou como e onde poderia quebrar o galho, navegar era preciso.
O dono indicou, 20 metros adiante, uma loja que dispunha de vários computadores, preço razoável. A moça gostou. Mandou subir a mochila para o quarto, nem subiu para ver como era, foi diretamente buscar as ondas digitais onde lançaria suas naves no oceano virtual.
Bem, subi ao meu quarto, tomei banho, desci para dar uma volta. Lá estava a moça agarrada ao teclado, a luz trêmula e azulada do monitor batendo em seu rosto.
Fui ver o "Putto in Giardino", de Verrochio, no pátio principal do Palazzo Vecchio. Almocei costeleta à moda florentina, tomei lentamente um chianti encorpado, com aquela cor viril dos vinhos da Toscana. Voltei ao hotel. A moça continuava navegando.
Ao cair a noite, saí para jantar, a moça continuava diante do mesmo monitor.
Jantei, voltei quase meia-noite, a tal loja estava deserta, somente uma pessoa navegava no mundo virtual: ela. Não almoçara, não jantara, não tomara banho, não mudara de roupa, não vira o anjinho de Verrochio nem a fachada de mármore de Santa Maria dei Fiori.
No dia seguinte, encontrei-a fechando a conta do hotel, indo para Bolonha. Perguntei se gostara de Florença. Sim, disse ela. "Adorei tudo. Amei os Botticelli no Uffizi".
A moça precisaria de duas horas só para enfrentar a fila e entrar no museu. Gostara sobretudo de "O Nascimento de Vênus".
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