Foi um mal-entendido. Alguém deveria ir nos buscar no aeroporto de Miami e não apareceu. Ficamos mais de duas horas esperando num saguão vazio, que enchia a intervalos com a chegada de outros vôos e logo esvaziava de novo. E então nossa única companhia eram dois funcionários do aeroporto, dois faxineiros negros que vez por outra apareciam em extremidades opostas do saguão, a caminho de outro lugar. Quando dava a casualidade de os dois aparecerem ao mesmo tempo, um gritava para o outro:
- River!
E o outro respondia, lá do outro lado:
- Boca!
Aquilo se repetiu não sei quantas vezes, enquanto esperávamos no saguão. Era só se enxergarem e um gritava:
- River!
E o outro:
- Boca!
Os dois eram corpulentos. Idades indefinidas. Poderiam ser gêmeos. Argentinos, claro. Não dava para imaginar dois americanos, ou latino-americanos de outra parte, evocando o River Plate e o Boca Juniors daquele jeito. Portenhos, por certo, embora seus físicos não fossem típicos. E a troca de gritos, aparentemente, repetia-se o tempo todo. O dia todo, todos os dias.
- River!
- Boca!
Era só se enxergarem.
Tinha começado como brincadeira, imaginei. Talvez tivessem chegado juntos aos Estados Unidos. Talvez fossem parentes, cunhados ou vizinhos. Só o que os separava era que um torcia pelo River e o outro pelo Boca. Cultivar aquela diferença era uma maneira de continuar em Buenos Aires. Era provável que nunca mais tivessem visto seus times jogar, mas ainda proclamavam sua paixão antiga. Nem que fosse só um para o outro, através de um saguão vazio.
- River!
- Boca!
Não era mais uma troca de provocações bem humoradas. Não era mais uma brincadeira. O tom ficara lamentoso. Os dois dependiam daquela rotina invariável para certificarem-se de que estavam ali, que continuavam existindo, e argentinos, mesmo longe de casa. E continuavam River e Boca. Uma ladainha contra o esquecimento, pensei. Uma canção do exílio para duas vozes tristes. Ou isto é literatura e os dois antípodas só combatiam o tédio.
Os dois devem continuar lá, fazendo a mesma coisa. O dia todo, todos os dias.
- River!
- Boca!
- River!
E o outro respondia, lá do outro lado:
- Boca!
Aquilo se repetiu não sei quantas vezes, enquanto esperávamos no saguão. Era só se enxergarem e um gritava:
- River!
E o outro:
- Boca!
Os dois eram corpulentos. Idades indefinidas. Poderiam ser gêmeos. Argentinos, claro. Não dava para imaginar dois americanos, ou latino-americanos de outra parte, evocando o River Plate e o Boca Juniors daquele jeito. Portenhos, por certo, embora seus físicos não fossem típicos. E a troca de gritos, aparentemente, repetia-se o tempo todo. O dia todo, todos os dias.
- River!
- Boca!
Era só se enxergarem.
Tinha começado como brincadeira, imaginei. Talvez tivessem chegado juntos aos Estados Unidos. Talvez fossem parentes, cunhados ou vizinhos. Só o que os separava era que um torcia pelo River e o outro pelo Boca. Cultivar aquela diferença era uma maneira de continuar em Buenos Aires. Era provável que nunca mais tivessem visto seus times jogar, mas ainda proclamavam sua paixão antiga. Nem que fosse só um para o outro, através de um saguão vazio.
- River!
- Boca!
Não era mais uma troca de provocações bem humoradas. Não era mais uma brincadeira. O tom ficara lamentoso. Os dois dependiam daquela rotina invariável para certificarem-se de que estavam ali, que continuavam existindo, e argentinos, mesmo longe de casa. E continuavam River e Boca. Uma ladainha contra o esquecimento, pensei. Uma canção do exílio para duas vozes tristes. Ou isto é literatura e os dois antípodas só combatiam o tédio.
Os dois devem continuar lá, fazendo a mesma coisa. O dia todo, todos os dias.
- River!
- Boca!
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