terça-feira, 6 de maio de 2008

Os pés do Dr. Ebbesmeyer - Luis Fernado Veríssimo

Não sei se você leu. A polícia de Vancouver, no Canadá, está investigando um mistério: o aparecimento de três pés humanos em praias de ilhas da região, num curto espaço de tempo. Pés direitos. E os três vestindo tênis. Não foi revelada a marca dos tênis, talvez para não alimentar a hipótese de se tratar do lançamento de alguma campanha publicitária macabra (“Você se decompõe, seu tênis não”, ou “Não caia na água sem eles”).

São muitas as especulações sobre a origem dos pés. Seriam de vítimas de afogamento ou acidentes de barco ou avião. Só os pés teriam sobrado depois que a água e os peixes acabaram com o resto. Ou seriam vítimas de algum matador e desmembrador em série. É possível que já estejam procurando fetichistas conhecidos com serra elétrica em casa. Não sei.

O que mais me intrigou na notícia foi o depoimento de um professor de Oceanografia da Universidade de Washington chamado Curtis Ebbesmeyer, descrito como um especialista em objetos flutuantes. O Dr. Ebbesmeyer não tinha opinião sobre de onde saíram os três pés mas tinha uma explicação para o fato de serem só pés direitos. Pelo formato dos tênis, os de pé direito flutuam naturalmente para um lado, os de pé esquerdo para o outro. Assim, não é improvável que apareçam pés esquerdos correspondentes aos pés já descobertos, mas em praias opostas, apesar de terem a mesma origem. Como autoridade em objetos flutuantes, o Dr. Ebbesmeyer tem a teoria pronta para sustentar sua tese.

Não sei que cara tem o professor, ou que ator o interpretaria quando fizessem o filme, mas posso imaginar as gozações que ele sofria no meio acadêmico por causa da sua especialização e das suas teorias. Aquela sua idéia de que um hipotético par de tênis posto numa superfície de água se separará, e flutuará um para um lado e outro para o outro de acordo com o seu formato, devia valer algumas piadas condescendentes para o velho Curtis, que nunca antes na sua carreira fora consultado sobre sua obsessão, as idiossincrasias dos objetos flutuantes. Até surgir o mistério dos pés direitos para consagrá-lo.

Ou então o próprio Dr. Ebbesmeyer teria, um dia, decidido mostrar aos incrédulos que o atormentavam que sua teoria não era risível, que ele não era

o louco que imaginavam. E providenciara os pés para o seu experimento.

Eu, se fosse a polícia canadense, veria se o Dr. Ebbesmeyer não tem uma serra elétrica.

sexta-feira, 2 de maio de 2008

Um magnífico apartamento - DANUZA LEÃO

TENHO pensado muito no lar do reitor da Universidade de Brasília. A impressão que dá é de uma lista de casamento daquelas de gente bem rica, só com itens caríssimos. Os "noivos", claro, não têm absolutamente nada a ver com nada. Fico pensando: terá sido contratado um decorador para cuidar do apartamento?

Terá sido dele a idéia de cinco -cinco- TVs de plasma? E onde seriam colocadas estas TVs? Uma na sala, claro, outra no quarto, também, claro, mas e as outras três? É preciso uma grande criatividade para decidir onde colocá-las. Imagino que uma no banheiro, fundamental para ver as notícias enquanto se toma um banho de banheira. As outras, nem imagino.
Mas para mobiliar um apartamento é preciso muita coisa; sofás, mesinhas, mesa de sala de jantar, cadeiras, camas, roupa de cama, travesseiros, toalhas de banho e de rosto, e não gosto nem de lembrar de tudo que precisei quando fui arrumar o meu. É evidente que com um orçamento de R$ 407 mil não é preciso fazer economia. E como os decoradores não vão às lojas para comprar miudezas -pratos, guardanapos, ralador de queijo, coador de chá, essas coisas- existem seus assistentes, que, como não precisam economizar, deitam e rolam comprando as coisas mais caras que encontram. No quesito cozinha, tudo importado, é claro.
Muito já se falou do que foi gasto no apartamento do magnífico reitor -será que ele é magnífico ou magnífico é o apartamento? Mas o que ainda não foi dito, e que me parece essencial, é, em primeiro lugar, saber quem autorizou os R$ 407 mil, se havia um orçamento ou se era tudo no vai-da-valsa. Afinal, o dinheiro não era de ninguém, como sempre. Em segundo lugar, deve ter havido um decorador, e eu também gostaria de saber quem foi ele e qual o critério para sua escolha.
Notório saber ou primo de algum professor da universidade? E em terceiro, quem foi correr as lojas escolhendo o abridor de garrafas de quase R$ 400, os cinzeiros, os jarros de flores, o balde de gelo, enfim, todas essas coisinhas necessárias ao bom funcionamento do lar de um reitor.
Gostaria de saber o nome de todos esses funcionários, desde o que autorizou a despesa até o que comprou a lata de lixo de R$ 1.000; alguém deu -tinha que dar- o ok para as compras. E também queria saber a lista de tudo, absolutamente tudo que foi comprado para que a casa ficasse habitável. Ah, e também quem autorizou a compra do carro de R$ 70 mil.
Eu -e a torcida do Flamengo- queremos detalhes, todos os detalhes, porque essa história de só falar de preço de lata de lixo e de abridor de garrafas e carro é muito pouco.
Não deve ser tão difícil abrir os arquivos da universidade e encontrar tudo, item por item. E sabendo quem fez as compras, saber também quanto de comissão levou cada um dos compradores. Como, aliás, é de praxe.